waltercio caldas_ os espelhos

14 ago - 11 out_ 2025

waltercio caldas_ os espelhos

Os Espelhos

Giulia Baitz

Waltercio Caldas subverte a essência de um objeto tão onipresente como o espelho. Longe de enxergá-lo como uma superfície meramente reflexiva, o artista o concebe como um objeto satírico, bem-humorado, que opera numa dimensão singular, revelando mais sobre a nossa percepção e expectativa do que sobre a realidade em si. Para o artista, a função mimética do espelho pode ser isolada e manipulada, criando ambientes espelhados que prescindem da necessidade dos vidros polidos.

A exploração de Waltercio com espelhos inicia-se no final da década de 1960, com uma vasta produção em 1975, período no qual ele direciona sua atenção sobre as possibilidades desse objeto — prática que se estende até hoje. Atraído pelo desejo de construí-lo, e não pelo objeto como o conhecemos, o artista produz um artefato que questiona função e funcionamento. O paradoxo se instala: o espelho mostra o que não se vê e, mais intrigante ainda, não mostra o que se espera ver — a imagem do espectador. A relação do espectador com a obra torna-se, então, parte essencial da poética do artista, na sua tentativa de atribuir outras funções aos espelhos e suas imagens.

Waltercio estabelece um instigante jogo entre a obra e o observador. Em Circunferência com espelho a 30° (1976), por exemplo, o espectador espera ver, ao se aproximar, seu próprio reflexo, mas é confrontado por um vazio e pela descoberta de um espelho que revela outra dimensão. Essa ausência inesperada quebra sua expectativa, é uma negação da mimese. A obra se revela um “objeto mimético com defeito”, subvertendo sua função tradicional e instigando uma nova forma de percepção.

Seus espelhos deslocam o mundo e nos fazem duvidar da ideia de lugar, são um convite que nos leva a reavaliar nosso entendimento sobre esses objetos e instiga nossa curiosidade. Seria a reflexividade, de fato, o caráter mais importante de um espelho? Materializar a ideia de espelhamento sem a necessidade de refletir nenhum objeto, esse é o desafio do artista. De uma superfície passiva, o espelho é transformado em um dispositivo ativo, em um provocador que desestabiliza nossa percepção, questiona nossa compreensão. Nesta exposição, as obras criticam e colocam em xeque a ideia de mimese e de objetos de arte. São convites à introspecção e à dúvida, desafiando o observador a ir além dos reflexos superficiais.